
Espaço Literário Carmelitano: Quisera subir muito alto: vida e escritos de irmã Letícia, OCD
Por Wallace Bertoli Moreira
O Espaço Literário Carmelitano desta edição apresenta a vida e os escritos de irmã Leticia, monja carmelita descalça. A breve biografia e os escritos aqui apresentados foram cedidos gentilmente por madre Adriana, OCD, do Carmelo de Nazaré, de Cariacica – ES.
Vamos conhecer um pouco de sua história: irmã Letícia da Mãe de Deus, batizada Nair Guimarães, nasceu em 8 de julho de 1931, na cidade de São Sebastião do Rio Verde, no Estado de Minas Gerais. Vocacionada à Ordem dos Carmelitas Descalços, entrou para o Carmelo de Petrópolis – RJ, no dia 6 de junho de 1954, na Solenidade de Corpus Christi, e viveu nesse Carmelo por 27 anos, cumprindo a missão de priora entre os anos de 1973 e 1976.
No ano de 1981, irmã Letícia da Mãe de Deus fez parte da fundação do Carmelo de Nazaré, em Cariacica, e, pondo-se a serviço da Ordem, abraçou por dois triênios, entre 1985 e 1991, o priorado. Depois, respondendo com generosidade à confiança das Irmãs, exerceu o cargo de primeira conselheira (subpriora) de agosto de 1994 até o dia de seu retorno à Casa do Pai, no dia 6 de junho de 2012.
Podemos perceber, de certa forma, que a vida e a espiritualidade carmelitanas nos convidam a colocar em folhas de papel ou nas telas de nossos computadores traços dessa experiência espiritual vivida no dia a dia. Muitos de nossos irmãos e irmãs da Ordem Carmelita Descalça (frades, monjas e leigos) se arriscam pelo campo da Literatura, fazendo alguns “rabiscos” de vários gêneros literários (poesias, crônicas e contos, entre outros), como também produzem escritos formativos que contribuem para o esclarecimento de pontos importantes para a vivência concreta desse belo carisma.
Basta olhar para nossos fundadores, Santa Teresa de Jesus e São João da Cruz, e vermos a quantidade de obras literárias que produziram, como Caminho de Perfeição e Castelo Interior, de Santa Teresa, e Subida do Monte Carmelo, Noite Escura e Cântico Espiritual, de São João, e podemos ir seguindo pelos inúmeros santos da Ordem: Santa Teresinha, Santa Elisabeth da Trindade e tantos outros.
Tais escritos são reflexos da experiência de fé concreta que se apresentam em simples palavras, que se tornam vivas porque estão plenas de Deus. Portanto, apresentamos aqui alguns escritos da Irmã Letícia da Mãe de Deus, que não são apenas letras que formam as palavras, ou palavras compondo as frases, são poesias que nos conduzem a enxergar a simplicidade de ser de Deus. Na poesia Quisera subir muito alto, a alma deseja subir até a morada divina e olhar tudo o que existe com os olhos amorosos de Deus:
Eu quisera subir muito alto, Senhor.
Quisera purificar meu olhar.
E ver tudo com teus olhos:
Eu veria então o universo, a humanidade, a história, como o Pai a vê.
(Eu) veria a bela, e eterna ideia de amor de teu Pai […]
Na poesia Diante de ti, Senhor, podemos encontrar uma expressão fundamental para a literatura carmelitana: o silêncio contemplativo para o encontro com Deus.
Estar […] diante de ti Senhor, […].
(Fechar) os olhos do corpo.
(Fechar) os olhos da alma,
e permanecer imóvel e silenciosa.
Expor-me a ti, que aí estás exposto a mim.
Estar presente (diante) de ti, ó Infinito Presente.
Aceito nada sentir, […].
Nada ver.
Nada escutar.
Vazia de toda ideia e de toda imagem.
Dentro da noite,
eis-me aqui, simplesmente,
para te encontrar, sem obstáculos,
no silêncio da fé […].
No caderno de escritos de Irmã Letícia, encontramos uma poesia chamada Hino a Santa Teresinha, que faz parte de algumas músicas e escritos em honra a Teresa de Lisieux, compilados pela religiosa, deixando por escrito a sua homenagem à santa. Esta poesia, porém, não é totalmente autoral, resultando da combinação de pequenos trechos de músicas, hinos, orações e escritos de autores não identificados, que a irmã adaptou em seu pequeno caderno.
Glória a Deus neste dia tão belo,
Honra e glória a Jesus salvador.
E à florzinha gentil do Carmelo,
revestida de novo esplendor.
Derramai vossas chuvas de rosas,
Teresinha, da pátria do amor:
Sobre a Igreja e sobre as almas ansiosas,
que a vós clamam com todo fervor.
Rosa de Deus querida,
és Santa Teresinha,
perfuma a nossa vida,
para o Céu nos encaminha.
Ensina teu caminho,
de amor e confiança,
em meio ao duro espinho,
sorrir (como uma) criança.
À tua escola, ó Teresinha,
(nós) queremos todos nos alistar,
és pequenina e meninazinha,
(nós) queremos todos te imitar […].
Mimosa flor do Carmelo:
Que de esplendor, vivo e belo,
cresceste ao pé da Cruz.
Pede por nós, Teresinha.
Ó Virgem, meiga e esposinha
do Deus menino Jesus.
Como filha da Ordem Carmelita, reza, em forma de poesia, à Santa Madre Teresa de Jesus, e pede, por sua intercessão, aos homens, a luz, a paz e a união na divina caridade. Vejamos a poesia Prece a Santa Teresa:
Mestra do amor e mestra da humildade.
Vem, Teresa de Jesus,
vem ao mundo sem paz,
unir todos os homens,
na suave e santa lei
da divina caridade
Vem ao mundo sem luz,
guiar todos os homens,
para a pátria feliz da eternidade.
Pois és mestra do amor e da humildade.
Mestra és do amor e da humildade,
vem ao mundo sem paz,
vem ao mundo sem luz,
vem nos revelar Jesus.
Muitos já devem ter experimentado colocar uma concha próxima ao ouvido para ouvir o som que dela vem, semelhante ao do mar. Para Irmã Letícia, na poesia Marulho Divino, em nós, no interior de nossa alma, um som ressoa: o som do amor.
Põe bem atento o ouvido
Na concha e fica a escutar:
Vê como a concha lá dentro
Guarda o marulho do mar.
Guarda o soluço das ondas,
Sua perene canção;
A concha guarda contente
Do mar a bela oração.
Deus também quer (escutar)
Teu coração pequenino
Ouvir lá dentro o amor,
Que é o seu marulho divino.
Quer tua alma escutando,
Como a concha do mar,
Sentir que guardas lá dentro
Um só desejo: amar…