11. DIA: (Ch 3, 77-85)
Meditemos agora com esses estofes da canção 3 de São João da Cruz:
Com estranhos primores
Calor e luz, dão junto a seu querido!
No comentário dos últimos versos, “com estranhos primores”, São João da Cruz apresenta três maneiras de primores:
1. A alma ama a Deus não por causa de si, mas por Ele mesmo, e o ama pelo Espírito Santo, ou seja, ama a Deus com o amor de Deus, por Deus mesmo;
2. A alma ama a Deus em Deus, pois tanto a alma quanto Deus já se entregaram um ao outro em amor;
3. A alma ama a Deus por aquilo que Ele é, porque Ele é essencialmente tudo em si mesmo.
Em resumo, os primores principais são a relação de amor mútuo entre a alma e Deus, e isso, obviamente, em grau superlativo, já que estamos tratando da mais alta união espiritual. Nessa profunda relação afetiva, o Doutor Místico dirá que “entre Deus e a alma se forma um amor recíproco, como na união e entrega do matrimônio em que os bens são comuns a ambos.
Esses bens consistem na divina essência, e cada um os possui livremente em razão da entrega voluntária de um ao outro, possuindo-os ao mesmo tempo conjuntamente, e assim podem dizer um ao outro o que o Filho de Deus disse ao Pai no Evangelho de São João: ‘Todos os meus bens são teus, e os teus bens são meus, e eu sou glorificado neles’ (Jo 17,10). Realiza-se isto na outra vida em fruição perfeita, sem intermissão; todavia acontece por vezes aqui na terra, neste estado de união, quando Deus opera na alma o ato de transformá-la nele, embora não se efetue com a mesma perfeição da eternidade.” (Ch 3, 79). Esses primores são múltiplos, se desdobram ainda em primores maravilhosos, que é quando a alma goza de Deus por Ele mesmo, e só se alegra Nele, apenas por suas maravilhas e atributos, sem nenhum outro gosto próprio.
Esses primores alcançam também a dimensão da gratidão e do louvor: a alma entende que foi criada para o louvor de Deus, e O louva pelos bens que recebe e pelo simples prazer de louvar ao Senhor, e sobretudo O louva por quem Ele é, para além de qualquer consolação, motivo ou prazer pessoal.