O significado de humildade, vaidade e serviço

14,1.7-14), Lucas nos faz entrar, com Jesus, na casa de um fariseu. Em defesa
dos fariseus, é bom que se diga logo: participavam desse grupo, surgido um
século antes de Cristo, pessoas sérias, que tinham normas morais elevadas e
observavam com rigor as leis religiosas.
Ao contrário dos saduceus, facção religiosa judaica da mesma época, os fariseus
acreditavam na imortalidade da alma e na ressurreição do corpo. O problema é
que sua observância rigorosa das leis aos poucos perdeu o sentido, pois suas
ações não eram conduzidas pelo amor, mas pela vaidade. Daí as críticas que
receberam de João Batista (“raça de víboras”) e de Jesus (“hipócritas”).
Voltemos à casa do fariseu que convidou Jesus para o almoço. Não somos os únicos
convidados: muitos outros chegaram antes de nós e, com a maior naturalidade,
ocuparam logo os melhores lugares. Jesus a tudo observa e, através de uma
parábola, dá uma lição: “Quando fores convidado para uma festa de casamento,
não ocupes o primeiro lugar. Pode ser que tenha sido convidado alguém mais
importante… Quando fores convidado, vai sentar-te no último lugar… Quem se
exalta, será humilhado e quem se humilha, será exaltado.”
Olhemos ao nosso redor, não para julgar os que nos rodeiam, mas para aprender
com o seu comportamento. Na organização da nossa sociedade, a vaidade tem uma
cadeira cativa. Para muitos, o importante é aparecer e ser admirado por todos,
ocupar postos importantes e manter-se em lugares de destaque. Quantas pessoas
constroem a sua vida em função de tais desejos, mesmo que para isso seja
necessário passar por cima de outros e cometer injustiças! Para eles, o
importante é serem admirados, aclamados e louvados. Isso lhes faz bem; deixa-os
satisfeitos. Pior para crianças e jovens que nascem e vivem em ambientes assim!
Cedo concluem: o dinheiro dá prestígio e poder; o poder dá “status”; o “status”
dá felicidade… A vaidade passa, então, a ser vista como uma virtude; as
necessidades dos outros, como “azar”, “resultado da preguiça”, “vagabundagem”…
A lógica de Jesus Cristo é a do serviço. Os dons (talentos), as riquezas e o
poder devem ser colocados a serviço dos outros. Ele nos ensina que o problema
não é ter, mas apegar-se (claro: quanto mais se tem, maior é a facilidade do
apego!). Não é errado ter poder; errado é usá-lo em benefício próprio; não é um
mal ter inteligência e boa formação: grave é quando tais capacidades são usadas
para dominar os outros, de forma rápida e eficaz.
Voltemos nossa atenção para o almoço na casa do fariseu. Tudo indica que
convidaram Jesus para melhor observá-lo: quem sabe, poderiam vê-lo cair em
contradição em algum ponto importante de sua doutrina… Teriam, então, uma
bela oportunidade para criticá-lo. Seu comentário final deve tê-los deixado surpresos:
“Quando deres um banquete, convida os pobres, os aleijados, os coxos, os cegos!
Então serás feliz, pois estes não têm como te retribuir”.
Para Jesus, o olhar que dá a verdadeira dimensão dos acontecimentos é o olhar
do Pai. Afinal, o que levamos dessa vida? Prestígio duramente conquistado?
Louvores, elogios e palmas? Ações compradas na Bolsa? Dinheiro aplicado em
bancos internacionais? Fama e bom nome?
Todos acreditam na morte; talvez o grande problema é que muitos não acreditam
em sua própria morte. Ou, então, acham que só morrerão depois de muitas e
muitas décadas. Para esses é impensável assumir como norma de vida a observação
de Jesus: “Receberás a recompensa na ressurreição dos justos”.
O Evangelho é uma proposta de vida. Sua verdade não depende de nossa aceitação
ou não. Isto é, não é porque nele acreditamos que ele passa a ser verdadeiro;
não é porque alguém deixa de acreditar nele que o seu conteúdo não o atingirá.
O Evangelho tem em seu fundamento em uma pessoa que morreu e ressuscitou: Jesus
Cristo, o filho eterno do Pai. Se o aceitarmos, teremos vida abundante; se não
o aceitarmos, nossa vida não passará de uma bela (e efêmera!) bolha de sabão…
Salvador (BA) – Primaz do Brasil.