
Mensagem do nosso Provincial para a quaresma
Nesta quarta-feira de cinzas iniciaremos em toda a Igreja o Tempo litúrgico da Quaresma.
Sobre este tempo, o Concílio Vaticano II nos dá a seguinte recomendação: “Tanto na liturgia quanto na catequese litúrgica, esclareça‑se melhor a dupla índole quaresmal, e, principalmente pela lembrança ou preparação do batismo e pela penitência, fazendo os fiéis ouvirem com mais freqüência a palavra de Deus e entregarem‑se à oração, os dispõe à celebração do mistério pascal. Por isso, utilizem‑se com mais abundância os elementos batismais próprios da liturgia quaresmal; segundo as circunstâncias, restaurem‑se certos elementos da tradição anterior. Diga‑se o mesmo dos elementos penitenciais” (SC 109). Assim, pelas orientações do documento conciliar, Quaresma é tempo de lembrança ou preparação ao Batismo. Lembrança do Batismo. O que significa o Batismo que um dia recebi ou para o qual estou me preparando? Buscando dar uma resposta que ajude a vivência quaresmal a esta pergunta, temos em primeiro lugar, que o Batismo é a imersão no Mistério da Trindade. Um mistério em nome do qual fomos batizados, “pois em Deus nos movemos, somos e existimos” ( At 17,28), tornando-nos morada da Santíssima Trindade. Com a imersão neste Mistério somos convocados a um diálogo mais profundo e existencial, a partir de uma vivência do colóquio amoroso, como o entendia S. Teresa de Jesus (“Diálogo de amizade com quem sabemos nos ama”) ou a vivência de uma “quaresma de amor” de Elisabeth da Trindade. Assim escrevia ela: “Na quarta-feira começamos a santa Quaresma. Quer passar comigo uma quaresma de amor? “Amou-me e se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2,20). O amor tem uma finalidade: dar-se, introduzir-se totalmente naquele a quem se ama. “O amor faz sair de si mesmo aquele que ama, a fim de transportá-lo, mediante um êxtase inefável, ao seio do objeto amado”. Que belo pensamento. Que ele seja como que o ideal luminoso de nossas almas. Que elas se deixem conduzir pelo Espírito de amor e que, iluminadas pela luz da fé, cantem desde agora junto com os bem-aventurados, o hino de amor que se canta eternamente diante do trono do Cordeiro. Sim, querida senhora, comecemos nosso céu na terra, nosso céu no amor. Ele mesmo é esse amor, conforme São João no-lo diz: “Deus é amor” (1Jo 4,8). Façamos, pois, do amor o lugar do nosso encontro.” (Carta de 15.02.1904, à sra. Angles). Mas a lembrança do batismo nos leva também a um a missão: a de formar comunhão na Igreja e na comunidade, a partir o mistério Trinitário. Num tempo de individualismos e de privatização da fé, o mistério batismal nos lembra que fomos inseridos no mistério da Igreja, Corpo de Cristo. É um tempo, então, de refletir sobre a própria vivência comunitária da fé e de participação na comunidade, pois isso é essencial ao ser do cristão, como nos lembra o Doc. De Aparecida, nos n. 154-163. A comunhão do Discípulo-missionário se sustenta na comunhão da Trindade e se alimenta no sacramento da Eucaristia, pois “a Igreja enquanto “comunidade do amor” é chamada a refletir a glória do amor de Deus, que é comunhão, e assim atrair as pessoas e os povos para Cristo” (DA 159). Por isso perguntamo-nos: Como está a minha vivência de fé na comunidade? A quaresma é também tempo de penitência, assim nos lembra o documento acima citado. Um tempo de penitência que leva adiante o processo de conversão, de saída e esquecimento de si e de crescimento da fé e da escuta do Evangelho de Jesus, através de uma mais assídua oração. É um tempo de profunda retomada dos valores essenciais da vida humana: no relacionamento com Deus, através de uma oração filial, do relacionamento com o próximo, através de uma caridade efetiva (esmola), e de um relacionamento consigo mesmo, de autodomínio e de relativização do supérfluo (jejum), que deve estar aberto às necessidades dos outros, contribuindo para diminuir os seus sofrimentos. Por isso, a penitência sacramental (confissão) tem sentido enquanto se insere neste processo de renovação de vida e de compromisso com o Evangelho do Reino, não apenas um mero cumprir o preceito de “fazer a páscoa” e a vida continue a mesma coisa… O sacramento da Reconciliação “nos renova na santidade e nos introduz no banquete do vosso amor”. Ele é a força para vencer, como e em Jesus, as tentações que nos assolam e desvirtuam a dignidade humana. Pela participação assídua na Liturgia da Igreja, buscamos a luz para seguir o Cristo, “Mestre e modelo da humanidade nova”. Neste ano B – ano no qual lemos o evangelho de Marcos aos domingos – o aspecto mais ressaltado pelas leituras dos evangelhos dominicais é o cristocêntrico. No seu seguimento pela fé, confessando-o “Filho de Deus” (Mc 1,1; 15, 16), no “perder a vida por causa de Cristo e do Evangelho” (cf. Mc 8,35) para ganhar a verdadeira vida, nos leva à participação no seu mistério pascal de Paixão, morte e ressurreição. Para este último mistério – a ressurreição -, é que somos encaminhados e ele é o fim do caminho de todo o cristão, pois em Cristo ressuscitado “encontramos nossa paz”. Nele é que fomos imersos e para a Páscoa definitiva caminhamos. Que esta quaresma nos ajude a viver em profundidade o Batismo que recebemos e que seja um tempo de renascimento e de esperança em Cristo ressuscitado, meta e origem de toda a história humana. Que tenhamos um tempo de preparação para a Páscoa de conversão e de vivência do batismo em profunda comunhão fraterna e com o Mistério da Trindade; com uma escuta mais freqüente da Palavra de Deus; com a oração mais intensa e prolongada , com o jejum e a prática das obras de caridade.