“FÉ NA MISERICÓRDIA DE DEUS”

“FÉ NA MISERICÓRDIA DE DEUS”


“A origem do Carmelo Descalço encontra-se
na pessoa de Santa Teresa de Jesus. Ela viveu uma profunda fé na misericórdia
de Deus, que a fortaleceu para perseverar na oração, humildade, amor fraterno e
amor pela Igreja, que a conduziu à graça do matrimônio espiritual…”
(Constituições OCDS, 7).

A vida e a doutrina de  S. Teresa são esclarecedoras para vivermos e
buscarmos nos seus escritos e doutrina orientações para viver e crescer na fé.  
Antes, porém, recordemos a
definição de fé que nos oferece o Catecismo da Igreja Católica: “A fé é a
resposta do homem a Deus, que a ele Se revela e Se oferece, resposta que, ao
mesmo tempo, traz uma luz superabundante ao homem que busca o sentido último da
sua vida” (§ 26).
Crer implica em auto
possuir-se e entregar-se, projetar-se no futuro, confiar que se chegará à meta
empreendida.  É transcender-se em direção
a algo ou Alguém.  Na raiz bíblica do
termo “emûnah”, que está na origem do
termo fé, tem o significado de solidez, estabilidade, firmeza (cf. 2 Sm 7,16;
Ne 9,8; Dt 7,9). Já no Novo Testamento, crer é acolher a mensagem e a pessoa de
Jesus: “Cumpriu-se o tempo, o Reino de Deus está próximo; convertei-vos e crede
no Evangelho” (Mc 1,15). É uma fé que precisa crescer (Mc 4,40), que é dinâmica
e inquieta, que chega por meio da escuta da palavra de Deus (Rm 10,14.17), que
sabe em quem se fiou (2 Tm 1,12); que o anuncia (2 Cor 4,13); que sabe que
Cristo habita no que crê (Ef 3,17); que é caminho de unidade (Ef 4,5) mas que é
também certeza do que não se vê (Hb 11,1) e sem a qual é impossível agradar a
Deus (Hb 11,6).
Ajudados
pelo que a Igreja nos oferece para o crescimento na fé, além vivência dos  sacramentos, da liturgia, da oração, temos mais
um  tempo de graça que é o Ano da fé – 11 de outubro de 2012 a 24
de novembro de 2013 -, lembrando os 50 anos do início do Concílio Vaticano II e
os 20 anos da publicação do Catecismo da Igreja Católica. O Papa Bento XVI
escreveu uma carta para esta ocasião intitulada Porta fidei.
Se a
“porta da fé” encontra-se sempre aberta 
a nós, pois “Deus é tão amigo de dar” (Caminho 27,4), sua meta é a
comunhão com Deus na comunidade-Igreja por meio do Batismo. Para que isso
ocorra é necessário entrar por esta porta e deixar-se plasmar pela Palavra de
Deus no caminho que leva à santidade, isto é, à plena comunhão com o Mistério
Trinitário no qual estamos imersos. Ao viver este Mistério, ele nos mostra que
Cristo Jesus é a encarnação do invisível amor do Pai. Este amor segue sendo
“derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5)
e  guia a Igreja nos caminhos da história
(Cf. Bento XVI, Porta Fidei, 1).
Os santos são
testemunhas privilegiados de fé vivida. S. Teresa
buscou sempre a verdade, que está na Palavra de Deus e na doutrina da Igreja
católica. Além do mais, agraciada com o dom da sabedoria, que torna quem crê
capaz de acolher a inspiração divina e deixa-se transformar por ela,  viveu a comunhão com o Deus Trindade presente
no íntimo de seu ser.
Ora, a fé também comporta um aspecto de luta para  manter-se fiel a uma meta. Por isso Teresa
aconselha a ter o “olhar fito em Jesus” para não deixar-se arrastar pelas
seduções passageiras do caminho, que tendem a dispersar as energias da pessoa e
retardar ou deter o passo. Ela  descreve  particularmente a luta que trava para não
voltar a uma situação de distanciamento de Deus nas segundas moradas do Castelo
Interior, pois percebem os chamados de Deus a irem mais adentro, mas sentem-se
impotentes para deixar as ocasiões que levam a desviar-se da meta e retrocedem
e caem no pecado. Teresa os descreve assim:
Assim ocorre com as almas que estão nas segundas moradas:
entendem os chamados que lhes faz o Senhor, porque vão se aproximando mais de
onde se encontra Sua Majestade, que é muito bom vizinho e tem tanta
misericórdia e bondade que uma vez ou outra não nos deixa de chamar, pois tem
em grande conta que O queiramos e procuremos a Sua companhia. Mesmo estando nós
em nossos passatempos, negócios, contentamentos e bagatelas do mundo, ora caindo
em pecados, ora levantando-nos … não deixa de nos chamar para que nos
aproximemos Dele. E essa voz é tão doce que se desfaz a pobre alma se não fizer
logo o que ela lhe ordena, sofrendo mais — como digo — do que se não ouvisse a
voz divina.
Porém, nos momentos de lucidez e de reflexão,
vive debatendo-se entre os dois caminhos:
É que a razão, por
outro lado, mostra-lhe o engano que é pensar que tudo isso [os atrativos do
mundo] vale alguma coisa em comparação com o seu fim último. A fé ensina-lhe o
que deve fazer”, apesar da inclinação que sente para o que é imediato: “Como a
fé se encontra muito amortecida, queremos mais o que vemos do que aquilo que
ela nos diz”. (2 Moradas 2. 4. 5).
Isto lembra-nos que o crer possui também seu lado doloroso:  “quantos Santos viveram na solidão! Quantos
crentes, mesmo em nossos dias, provados pelo silêncio de Deus, cuja voz
consoladora queriam ouvir! As provas da vida, ao mesmo tempo que permitem
compreender o mistério da Cruz e participar nos sofrimentos de Cristo (cf. Cl 1, 24) , são prelúdio da alegria e da
esperança a que a fé conduz: «Quando sou fraco, então é que sou forte» (2
Cor
 12, 10)” (Porta fidei 15).
Teresa
viveu estes aspectos na oração perseverante, nas obras da fé em benefício da
Igreja. Através da oração e  contemplação
do Modelo e  Caminho que é Cristo,
pode-se chegar à meta pela graça de Deus:
“O próprio Senhor diz: Ninguém subirá a meu Pai senão por mim. ... E
também: Quem vê a mim vê a meu Pai. Pois, se nunca olhamos para Ele, nem
consideramos o que Lhe devemos e a morte que sofreu por nós, não sei como O
poderemos conhecer nem fazer obras em Seu serviço.
Que valor pode ter a fé sem obras? E o que valerão estas se não se unirem
aos merecimentos de Jesus Cristo, nosso Bem? E quem nos despertará a amar esse
Senhor? Praza a Sua Majestade dar-nos a entender o muito que lhe custamos e
como o servo não é mais do que o Senhor. Que Ele nos mostre também que
precisamos trabalhar para gozar de Sua glória; para isso, é necessário orar, a
fim de não andar sempre em tentação.” (S. Teresa, 2 M 11).
Já na plenitude da vida espiritual descrita na sétima Morada, Teresa
testemunha como a fé leva a um conhecimento experiencial:
“Dessa maneira, o que acreditamos por fé é entendido ali pela alma por
vista, se assim o podemos dizer, embora não seja vista dos olhos do corpo nem
da alma, porque não se trata de visão imaginária. Na sétima morada,
comunicam-se com ela e lhe falam as três Pessoas. Elas lhe dão a entender as
palavras do Senhor que estão no Evangelho: que viria Ele, com o Pai e o
Espírito Santo, para morar na alma que O ama e segue Seus mandamentos” (7 M
1,6).
Possa o Ano da fé sustentar-nos na mesma 
fé da Igreja e que S. Teresa viveu e pela qual gastou suas energias: uma
fé que “age pela caridade” (Gál 5,6). Ao mesmo tempo nos faça  viver “com esperança o nosso serviço no mundo,
aguardando «novos céus e uma nova terra, onde habite a justiça» (2 Ped 3, 13; cf. Ap 21, 1)” (Porta fidei 14).
Fr. Alzinir

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