MARIA EM ELISABETE DA TRINDADE

MARIA EM ELISABETE DA TRINDADE

            Elisabete vê em Maria a perfeita
realização de seu ideal de vida interior.
1. ANTES DE
ENTRAR NO CARMELO: “Maria, eu me coloco sob a tua proteção” (Poesia 1, Maria, ó
terna mãe).
– Na sua
infância e juventude dirigia-se a ela como protetora de sua pureza, e em todas
as suas festas renovava o seu voto de virgindade. (Que fez com 14 anos).
– Na sua
juventude cultivou um grande amor a Nossa Senhora de Lourdes, aos pés de quem
estava sempre prostrada suplicando que a protegesse e oferecia-se em suas mãos
como vítima pelos pecadores.
– Ela jamais
saia de casa para uma festa mundana, sem primeiro invocar a proteção e as
bençãos da Santíssima Virgem.
– Aos 14 anos,
Elisabete foi em peregrinação, acompanhada de uma amiga, ao santuário de Nossa
Senhora de Etang, para pedir a graça de morrer jovem.
– O seu Diário
Espiritual de jovem, é cheia de referências a Maria.  Em todas as ocasiões ela vive sob o olhar de
Maria que vela constantemente sob os seus passos.
– Eis algumas
passagens do seu diário que são testemunhos de seu amor filial a Maria:
2 de fevereiro
de 1899 – festa da purificação de Maria – “em cada festa de Maria, renovo minha
consagração a esta boa Mãe. Hoje, pois, confiei-me a ela e de novo lancei-me em
seus braços. Com a mais inteira confiança, recomendei-lhe meu futuro e minha
vocação”.
12 de março de
1899 – “Meu Mestre querido, se não me derdes aquela alma, morrerei de dor.
Dai-ma, vo-lo conjuro, mesmo á custa de qualquer tormento. Maria Virgem de
Lourdes, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, vinde em meu auxílio; sem um
milagre vosso, tudo está perdido. Conto com vosso milagre”.
24 de março de
1899 – “Ò Maria, a quem imploro todos os dias a graça da humildade, vem em meu
socorro, esmaga o meu orgulho, envia-me muitas humilhações, querida Mãe”.
2 de abril de
1899 – “Tudo terminado! Como passou rápido esta missão! Antes de sair da igreja
confiei meu pobre pecador à Virgem do Perpétuo Socorro; prometera invocá-la
todos os dias por aquela pobre alma. Depois consagrei-me novamente a Maria . a
ela me abandonei com plena confiança. Ela ouviu-me tão bem a respeito de minha
vocação. Jamais poderei dizer-me todo o meu amor e gratidão. Sinto-me tão
feliz! Meu coração transborda de alegria. São as prelibações da minha
felicidade. Ó mãe do Perpétuo Socorro, cada dia invocar-te-ei por uma dupla
intenção: para que continueis a sustentar minha querida mãe, que agora me
compreende tão bem; e para que me sustentes também neste caminho da cruz,  onde entro tão alegre, seguindo o meu Jesus.
Mãe, obtém-me a graça de perseverar e de tornar-me perfeita. Guarda o meu
coração puro”.
2. NO CARMELO:
“Mãe do Verbo… passaste pela terra abismada em adoração” (Poesia 88 – há um
que conhece todo o mistério).
            Quando entra no Carmelo sua devoção
a Maria chega rapidamente a uma vida de intimidade profunda. E Maria vai
introduzir Elisabete no mistério da interioridade.
“Parece-me que
a atitude da Santíssima Virgem durante os meses decorridos entre a Anunciação e
a Natividade é o modelo das almas interiores, das criaturas escolhidas por Deus
para viverem “dentro”, no fundo do abismo insondável. Com que paz, com que
recolhimento Maria se entregava a todas 
as ocupações! Como as ações banais eram pro ela divinizadas! Porque em
tudo a Virgem continuava a ser a adoradora do dom de Deus! Isto não impedia de
entregar-se às obras exteriores quando a caridade exigia. O Evangelho narra que
Maria percorreu diligentemente as montanhas da Judéia para visitar sua prima
Isabel”. (Retiro como encontrar o céu na terra, julho 1906 – No. 40).
“Reflita sobre
o que deve ter passado na alma da Virgem, quando, depois da Encarnação, possuía
dentro de si o Verbo Encarnado, o Dom de Deus. Em que silêncio, em que
recolhimento, em que adoração não deve ter ela submergido nas profundezas de
sua alma para estreitar carinhosamente aquele Deus de quem ela era mãe” (Carta
152, a Margarida Chevignard, sua irmã, 22/11/1903).
– Elisabete vai
chamá-la freqüentemente de a Virgem da Encarnação: ressaltando que Maria viveu
em silêncio e a adorar a Deus, escondido no mais profundo de sua alma.
– Tinha grande
devoção para com uma estampa que lhe deram e que representava a Virgem da
Encarnação, recolhida sobre a ação da Trindade:
   “Na solidão de nossa pequena cela, que eu
chamo de meu pequeno paraíso, porque está totalmente plena daquele que é a vida
do céu, não me cansarei de contemplar a preciosa imagem e me unirei à alma da
Virgem no momento em que o Pai a cobria com a sua sombra, enquanto o Verbo se
encarnava nela e o Espírito Santo descia para realizar o grande milagre. Toda a
Trindade se empenhou neste ato, agindo e entregando-se. E porventura não é em
todas estas vinculações divinas que deve transcorrer a vida inteira duma
carmelita?” (Carta 219, asra Sourdon, novembro de 1905).

Aprofundando-se em São João da Cruz, Elisabete descobre em Maria o modelo
perfeito da união transformante e deseja passar pela terra como a santíssima
Virgem: silenciosa e adoradora do Verbo, inteiramente perdida no mistério da
Trindade:
    “Atualmente estou lendo umas lindas páginas
do nosso bem-aventurado pai São João da Cruz, onde fala da transformação da
alma nas três Pessoas Divinas. Reverendo, a que abismo de glória somos
chamados! Como compreendo, agora, o recolhimento e o silêncio dos santos que
não conseguiam mais abandonar a sua contemplação. E por isso Deus podia
transportá-los para aqueles cumes divinos onde se consome a unidade entre ele e
a alma que se tornou esposa no sentido místico da palavra. O nosso
bem-aventurado pai diz que então o Espírito Santo eleva a alma a alturas tão
admiráveis, a ponto de torná-la capaz de produzir em Deus a mesma aspiração de
amor que o Pai produziu com o Filho e o Filho com o Pai, inspiração que não é
senão o próprio Espírito Santo. Dizer que, por nossa própria vocação, o Senhor
nos chama a viver imersos nesses santos esplendores… Oh! Que mistério
adorável de amor! Quisera responder a este chamado, passando sobre a terra como
a Santíssima Virgem, conservando cuidadosamente todos esses acontecimentos no
meu coração (cf. Lc 2,19), sepultando-me, por assim dizer, no fundo da minha
alma para desaparecer na Trindade que nela mora e transformando-me nela. Então
o meu nome, “o meu ideal”, como você o chama, se tornaria uma realidade e eu
seria de verdade Elisabete da Trindade!…” (Carta 153, ao seminarista
Chevignard, 28/11/1903).
TEXTO
COMPLEMENTAR:
“A Virgem
da encarnação”
38. “Se
conhecesses o dom de Deus” (Jo 4,10), dizia o Cristo à Samaritana. Mas
qual é este dom de Deus, senão ele mesmo? “E”, diz-nos o discípulo
amado, “veio aos seus e os seus não o receberam” (Jo 1,11). São João
Batista poderia dizer ainda a muitas almas, estas palavras de reprovação:
“Há alguém no meio de vós, que vós não conheceis” (Jo 1,26). “Se
conhecesses o dom de Deus!”
39… Existe
uma criatura que conheceu este dom de Deus, uma criatura que não perdeu nenhuma
parcela deste dom, uma criatura que foi pura, tão luminosa que parece ser a
própria Luz: “Speculum justitiae” (o espelho da justiça); uma
criatura cuja vida foi tão simples, tão perdida em Deus, que quase nada se pode
dizer a respeito: Virgo fidelis, é a Virgem fiel, aquela “que guardava
todas as coisas em seu coração” (U 2,51 ). Conservava-se tão pequena, tão
recolhida diante de Deus, no segredo do Templo, que atraiu sobre si as complacências
da Santíssima Trindade: “Porque olhou para a humilhação de sua serva,
doravante as gerações todas chamar-me-ão bem-aventurada!. . . “O Pai, ao
inclinar-se sobre esta criatura tão bela e tão indiferente à própria beleza,
quis que ela fosse, no tempo, a Mãe daquele de quem ele é o Pai na eternidade.
Então veio o Espírito de Amor, que preside a todas as operações divinas, e a
Virgem disse o seu Fiat: “Eis aqui a serva do Senhor, que se faça em mim
segundo a vossa palavra” (Lc 1,38), realizando-se o maior dos mistérios.
Pela descida do Verbo nela, Maria tornou-se, para sempre, a presa de Deus”.
(Retiro como
encontrar o céu na terra, julho de 1906, Nos. 38-39)
3. MARIA A
PORTA DO CÉU
            No Carmelo a intimidade com Maria se
intensifica a um tal grau, que ela estará presente em todos os pormenores da
vida de Elisabete.  E que a acompanhará
sobretudo no período de sua doença e que a introduzirá no céu. Elisabete a
denominará: “Janua Coeli”: Porta do céu.
– Quando já
estava na enfermaria (entra em 30 de outubro de 1906), certa noite, ao pousar
os olhos sobre uma imagem da Mãe das Dores, suspensa á parede, Ir. Elisabete
“lembrou-se de uma imagem de Nossa Senhora de Lourdes, junto da qual recebera,
quando jovem, muitas graças, mandou pedi-la a sua mãe a fim de que Aquela que velara
por sua entrada no Carmelo, “guardasse também a saída” (Sl 121{120},8). Desde
então, chamou-a Janua Coeli. Esta imagem não a deixou mais” (Memórias, cap. 14,
p. 188).
– Um dia,
próximo de sua morte, irmã Elisabete depositou na cela da madre priora uma
cidadela  feita em cartão contendo uma
ponte levadiça. Perto da porta fechada estava a Virgem de Lourdes: era Janua
Coeli. Num dos cantos da torre dentada, um pequeno estandarte tremulava com a
seguinte inscrição: “Cidadela da dor e do recolhimento, habitação da Laudem
Gloriae, enquanto espera a ida para a casa do Pai”
– Seu último
retiro na terra, ela quis pôr sob a proteção de Janua Coeli, e no dia 15 de
agosto entrava no recolhimento como preparação para sua entrada no céu, e assim
se expressa: “Minha Madre, mergulho neste sagrado silêncio da Trindade Santa
… sinto-me feliz porque posso encontrá-la durante minha longa viagem. Parto
com a Santíssima Virgem na noite de sua Assunção, a fim de preparar-me para a
vida eterna. Nossa madre me fez muito bem quando me disse que este retiro seria
o meu noviciado do céu e que no dia 8 de dezembro a Santíssima Virgem me
revestirá com o hábito da glória, se me encontrar pronta. A bem-aventurança me
fascina sempre mais. Meu divino Mestre e eu só nos preocupamos com este
assunto. Todo interesse dele consiste me preparar-me para a vida eterna” (Carta
259, a Madre Maria de Jesus, agosto de 1906).
TEXTO
COMPLEMENTAR:
“Janua
Coeli”, “A porta do céu”
                        “Sem dúvida, depois de
Jesus Cristo, à distância que existe entre o infinito e o finito, há uma
criatura que também foi o grande louvor de glória da Santíssima Trindade. Ela
correspondeu plenamente à eleição divina, de que fala o apóstolo S. Paulo; ela
sempre foi pura, imaculada, irrepreensível aos olhos do Deus três vezes santo.
                        A sua alma é tão
simples, seus movimentos tão profundos que não se pode surpreendê‑los. Ela
parece reproduzir na terra a vida específica do Ser divino, o Ser simples. É
tão transparente, tão luminosa, que julgaríamos ser ela a própria luz. No entanto,
é apenas o “espelho do Sol de justiça”.
                        “A Virgem
conservava estas coisas em seu coração” (Lc 2,51). Toda a sua história
pode resumir‑se nestas pou­cas palavras; foi no coração que viveu e em tal
profundidade que nenhum olhar consegue segui‑la. Quando leio, no Evangelho, que
Maria percorreu, apressadamente, as montanhas da Judéia para ir cumprir a sua
obra de cari­dade para com a sua prima Isabel, vejo‑a passar tão bela e tão
calma, tão majestosa e recolhida em si mesma, com o Verbo de Deus! Como a dele,
a sua oração foi sempre a seguinte: “Eis‑me aqui!” Quem? A serva do
Senhor (Lc 1,38), a última de suas criaturas, ela, sua Mãe!
                        Quão verdadeira foi em
sua humildade! É que sempre se esqueceu de si mesma, ignorou‑se a si própria,
esteve libertada dela mesma! Por isso podia cantar: “O Todo­ ‑Poderoso fez
em mim grandes coisas; doravante, todas as nações chamar‑me‑ão bem‑aventurada”
(Lc 1,48‑49).
                        Esta Rainha das Virgens
é também a Rainha dos Már­tires; e é no seu coração que “a espada a
traspassou” (Lc 2,35), porque nela tudo se passa no íntimo… Oh! como é
belo contemplá‑la durante o seu longo martírio, tão serena, envolvida numa
espécie de majestade que respira, ao mesmo tempo, a força e a doçura! É que
aprendera com o próprio Verbo como devem sofrer aqueles que o Pai  escolheu como vítimas, aqueles que quis
associar à grande obra da redenção, “os que conheceu e predestinou para
serem conformes ao seu Cristo”, crucificado por amor. Aí está e1a,ao pé da
cruz, de pé, forte e corajosa; e o meu Mestre me diz: “Eis aí a tua
mãe” (Jo 19,27). Ele ma dá como Mãe! Agora que voltou para junto do Pai,
que me deixou em seu lugar na cruz, para que eu sofra em mim “o que falta
à sua paixão pelo seu corpo, que é a Igreja”, a Virgem Maria ainda está aí
para ensinar‑me a sofrer como ele, para dizer‑me, para me fazer ouvir estes
últimos cantos de sua alma, que nenhuma outra pessoa a não ser ela, a sua Mãe,
conseguiu captar.
Quando eu
disser o meu “está consumado”, será ainda ela, Janua Coeli, a Porta
do Céu, que me introduzirá nos átrios eternos, segredando‑me as misteriosas
palavras: “Alegrei‑me com o que me foi dito: iremos à casa do
Senhor!…” (Sl 122,1).
(Último Retiro
de “Laudem Glóriae”, agosto de 1906 – 10o. dia – Nos. 40-41).
Fontes
consultadas:
– M. Philipon.
Doutrina Espiritual de Elisabete da Trindade. Paulus 1988.
– Memórias.
Noticia biográfica de Elisabete da Trindade escrita por sua priora, Me. Germana
de Jesus. 1956.

– Obras
Completas – Elisabete da Trindade. Vozes, Petrópolis 1994. 

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