Para não “des-crescermos”

Para não “des-crescermos”

Nas sétimas moradas
SANTA TERESA nos chama a atenção:
8.
“Se não tiverdes essa determinação, não espereis grande benefício. Porque o
fundamento de todo este edifício, como eu já disse,9 é a humildade. E se esta não for genuína, até
para o vosso bem o Senhor não desejará elevá-lo muito, a fim de que não desabe
por terra.
Desse
modo, irmãs, para que esse edifício tenha bons alicerces, procure cada uma ser
a menor de todas, e sua escrava, vendo como ou em que podeis servi-las e
dar-lhes prazer. O que fizerdes neste caso o fareis mais para vós do que para
elas. Assentareis pedras tão firmes que o vosso castelo não desabará.

9.
Repito que, para que o façais, não deveis assentar vossos alicerces só em rezar
e contemplar. Com efeito, se não buscardes virtudes e o exercício delas, sempre
ficareis anãs. E praza a Deus que não seja apenas no crescer, porque já sabeis
que quem não cresce diminui. Tenho por impossível que o amor, se o houver, se
contente em limitar-se a um ser.”


“COSTUMES” de quem não quer progredir

Teresa escreveu sobre “os costumes que há nesta casa”, o estilo de vida que desejava estabelecer. Um conjunto de hábitos –linhas de vida- que podem ir forjando o caráter pessoal e comunitário. Direções interiores que encaminham os desejos e fazem crescer humana, espiritual e relacionalmente.
Teve empenho em transmitir alguns costumes que lhe pareciam sadios e bons para crescer. Com aquele convencimento de que “quem não cresce, des-cresce”, pensava que “acostumar-se” a determinadas coisas ajudava a não estancar-se, a manter o movimento positivo.
Esta mulher, que viveu em um século dirigido por varões e uma Igreja que conduzia a base de normas, compreendeu que não eram as normas nem as leis o que fazia avançar na autoconsciência e a responsabilidade pessoal. Por tanto, não parecia ser esse o melhor caminho para seguir a Jesus e construir a Igreja.

Isso não significa que Teresa vivesse a margem do estabelecido ou enfrentada, colocando-se a si mesma como norma. Sabia muito bem que, para criar comunidade, é indispensável  que a acolhe, mesmo precisando de transformação. E esta é uma das ideias que sustenta a renovação que fez.

Sob a falsa modéstia de “coisas pouquinhas”, ela levanta um talante humano novo, baseado em educar a capacidade de eleger. Porque como explica Adela Cortina, a eleição modifica a própria realidade, na medida que se incorpora e se faz carne de um mesmo. Essas “coisinhas, remédios, costumes”, que se podem ir escolhendo, são uma peça importante para lavrar o edifício interior e modelar a própria identidade, sem a qual não pode existir relação, alicerce do ser humano. Existem pequenos costumes, importantes pelo húmus que vão criando, porque geram um habitat para o crescimento. Cultivar a capacidade para estar em solidão, indispensável para ter solidez e viver com coerência. Ou o costume de fazer o que Teresa chama pequenos “atos amorosos”, que serão diferentes para cada pessoa.
Não servem listas, não há um regulamento. São atos que nascem do interior para fora e cuidam daquilo que realmente se deseja. E, ao mesmo tempo, acostumar-se “nas pequenas coisas trazer grande cuidado”, dá grande fortaleza.
O costume de não tomar-se muito a sério, de não andar justificando-se continuamente… “parecerá impossível…no início é difícil; mas sei que se pode alcançar esta liberdade”. E o habito de emendar-se, para que as faltas “não criem raízes, pois serão pior para depois arrancar”. Mas também, o entranhável costume de andar com amigos: “procurem amizade e trato com outras pessoas que tratem do mesmo” para “fazer-se costas”, dar-se mutuamente luz e crescer.
Outros costumes são importantes pelas pistas de crescimento que abrem e porque envolvem muitos aspectos da vida.
O costume de “andar acordados”. Despertai repete Teresa, de muitas maneiras. “É mister cuidado… andar com aviso… sempre velar”. Para poder escolher o caminho que realmente se deseja seguir é necessário a atenção e a consciência ativa. Por isso que insiste em “avivar” o amor e a fé. Um “não nos descuidar nem pouco e nem muito”, para não ficarmos anões.
“Andar com advertência” para não deixar-se levar pelo egoísmo, porque isso atrapalha o crescimento, “ser aficionadas a dar muito, mais que a receber”. E para isso, “umas a outras se despertam e ajudam”. Uma vez mais, o grupo, a comunidade, com o despertador.
O costume de “recolher-se”. O “recolhimento”, que é “entrar dentro de si”. Acostumar-se a “olhar dentro de si” para viver desde o profundo, desde o mais real. Teresa oferece um questionamento mui positivo: este recolher-se e entrar no interior é “ganhar-se a si para si, que é aproveitar-se de seus sentidos para o interior”. Não é rejeitar, nem o externo nem a própria natureza, é ir às raízes com tudo e estar em tudo desde o profundo.
É claro que Teresa sabe que, quase sempre, as coisas mais valiosas não se fazem espontaneamente, senão que temos que nos esforçar, fazer um “pouquinho de força”, de tal maneira que “nas mesmas ocupações possamos nos recolher em nós mesmos”.
O costume de “mirar”, de “voltar os olhos da alma”. O primeiro, a mirada interior já indicada: “colocai os olhos em vós e mirai no vosso interior; encontrarei o vosso mestre, que não vos faltará”. A partir de ai, o habito de mirar aos outros com a mirada mais autentica, para assim poder atender às “coisas boas que veremos nos outros e cobrir seus defeitos”. Por último, ter o costume de olhar ao longe, que leva a atender aquilo que é “para sempre”. Teresa vai dizer que importa colocar “os olhos no verdadeiro e perpétuo reino”.
Para Teresa o caminho para o interior está marcado por Jesus Cristo. Crescer será chegar à plena identificação com Ele, hospede íntimo, amigo e companheiro. Essa identificação liberta o mais humano, o melhor de cada um, até mesmo não reconhecendo no percurso a Cristo.
“Acostumar-se e enamorar-se” vai ser o definitivo, porque só o amor sustenta a vida. “Quem trabalhar em trazer consigo esta preciosa companhia e se aproveitar muito dela e deveras cobrar amor a este Senhor a quem tanto devemos, eu o dou por muito bem aproveitado”.

tradução: frei Francsco Yudego Xavier, OCD
http://delaruecaalapluma.wordpress.com    

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