SOLENIDADE DE SÃO JOSÉ, ESPOSO DA BEM-AVENTURADA VIRGEM MARIA

SOLENIDADE DE SÃO JOSÉ, ESPOSO DA BEM-AVENTURADA VIRGEM MARIA

Província São José
Comissão de Espiritualidade
19 de março de 2022

O culto a São José na doutrina teresiana

Celebrando a Solenidade de São José esposo da Bem-Aventurada Virgem Maria, buscamos na doutrina teresiana o culto a São José desenvolvido na vida cristã, na tradição e cultura do Carmelo. Vemos na vida de Santa Teresa, São José encontra uma posição de destaque sempre ao lado da Virgem Maria e de seu divino Filho, que Deus confiou-lhe “com grandes promessas”, que diante da obra que seria empreendida, o glorioso santo “os guardaria a uma das portas e Nossa Senhora à outra e Cristo andaria conosco” (STJ – Vida 32,11). Inspirado por Deus, São José participou simultaneamente com Maria da realidade do mistério da salvação, e foi depositário do mesmo amor, em virtude do qual o eterno Pai «nos predestinou a sermos adotados como filhos, por intermédio de Jesus Cristo» (Ef 1, 5). Assim, foi chamado a proteger o Redentor, «José fez como lhe ordenara o anjo do Senhor e recebeu a sua esposa» (Mt 1, 24). Inspirando-se no Evangelho, a Igreja e o Carmelo, desde os primeiros séculos, pôs em relevo que São José, assim como cuidou com amor de Maria e se dedicou com empenho jubiloso à educação de Jesus Cristo, assim também guarda e protege o seu Corpo místico, a Igreja, da qual a Virgem Santíssima é figura e modelo.

 

No Carmelo o culto a São José faz parte de nossa formação cristã, de nossa tradição e cultura. Somos habituados a colocar São José ao lado de Jesus e de Maria, ao ponto de pensar que a Igreja sempre tributou a este santo que viveu em estreita intimidade com o mistério da Encarnação, a dignidade e a honra com os quais estamos acostumados. Para os Carmelitas o interesse pela figura de São José foi um desenvolvimento natural da inspiração mariana da Ordem. Todos os familiares de Maria receberam uma honra particular no Carmelo. A liturgia antiga do Carmelo celebrava São José como o primeiro entre seus contemporâneos em Nazaré a ser escolhido pela divina Providência para esposo da Virgem, a fim de que o Filho de Deus pudesse entrar no mundo de forma honrada e escondida. Pregadores carmelitas afirmam: assim como Maria concebeu o Verbo no seu seio por obra do Espírito Santo, assim São José por obra do Espírito Santo concebeu na contemplação o Cristo na sua alma, tornando-se pai de Jesus sobre esta terra. A liturgia celebrava também a união nupcial de José com a Virgem e o contemplava como protetor de sua virgindade e da vida do Filho de Deus encarnado. Com a sensibilidade típica do carisma contemplativo do Carmelo, a liturgia daquele tempo celebrava a pureza da Virgem e de São José em termos de disponibilidade a Deus, que torna possível a acolhida do mistério da Encarnação.

 

“O Senhor nos quer dar a entender que, assim como lhe foi sujeito na terra – pois como tinha nome de pai, embora sendo apoio, O podia mandar -, assim no Céu faz quanto Lhe pede” (STJ – Vida 6,6)

 

A tradição do Carmelo mostra-nos que Santa Teresa de Jesus ampliou esta tradição trazendo um grande proveito para todo o Carmelo e para a Igreja universal. É inegável que mais do que nenhum outro santo que S. Teresa de Jesus fez do culto a São José um dos elementos característicos da piedade e da fisionomia espiritual do Carmelo. Não por acaso ela é herdeira de um culto intenso e da devoção josefina, pois como em todas as suas obras são demonstradas pela “experiência” o seu trato de amizade com Deus, também o seu encontro com São José nasceu de suas experiência com o “glorioso Santo”. Assim, num dos períodos mais difíceis de sua vida, por volta 25 anos, sofreu uma longa e penosa enfermidade e as curas dos médicos da terra resultaram não só ineficazes, mas também prejudiciais: permaneceu paralisada e esgotada fisicamente e psicologicamente. Sente que não tem ajuda válida de ninguém que esteja a seu lado e é neste momento que impulsionada por uma intuição interior, apela a São José como seu “pai e senhor” (Vida 6, 6; 33, 12). São José se mostrará tal para com S. Teresa o resto de sua vida. Ele a libertará em todas as suas necessidades, exercitando para com ela e sua obra a função de custódio e protetor. Sua experiência nesta devoção a São José será um traço distintivo da reforma teresiana, centrada na amizade com Jesus Cristo.


São José é ainda apresentado na liturgia antiga do Carmelo como o esposo virginal de Maria, unido a ela com um matrimônio verdadeiro, no qual a sua autoridade de esposo, protetor e pai manifesta-se no total serviço a ela. O que temos certeza é que, a devoção a São José no Carmelo foi, desde o início, marcada pelo culto litúrgico, e se desenvolverá até os nossos tempos numa impostação também eucarística na devoção a São José, apresentando-o como aquele que tem na mão o pão da salvação, nosso alimento. Na verdade, é impossível dizer quando exatamente tiveram início as celebrações da festa de São José nas igrejas carmelitanas.

“O valor da humanidade de Cristo”

Os santos precisam ser vistos e compreendidos em seu contexto histórico e eclesial, porque na realidade, todo o santo é um mensageiro de Deus e é uma palavra dita ao mundo, um fragmento do Evangelho de Cristo, a ser reordenado também no mosaico da santidade na histórica da Igreja. Assim foi com S. Teresa, sua vida desenvolve-se entre 1515 e 1582, o século de ouro da Espanha, com as suas conquistas no exterior, guerras, esplendor literário, reforma religiosa na qual intervêm o Papa e o Rei com notáveis conflitos jurisdicionais, como uma mulher, escritora e letrada, plenamente inserida na história eclesial e civil, embora seja monja, que sofre os valores e as sombras deste período, mesmo que reagindo contra esta situação em muitos aspectos: em nível social, nos temas do feminismo, nas críticas às violências da guerra; também no campo religioso-espiritual, que se coloca contra a mentalidade de sua época em temas de vida e doutrina cristãs, como a oração e o valor da humanidade de Cristo. Vemos, portanto, historicamente que S. Teresa é filha de seu tempo, porém, com uma profunda unção que a projetou para esses 400 Anos de história, para a Igreja e o Carmelo, e para nossas vidas.


Conformação com Cristo em São José

 

A comunhão de vida entre José e Jesus leva-nos a considerar ainda o mistério da Encarnação precisamente sob o aspecto da humanidade de Cristo, instrumento eficaz da divindade para a santificação dos homens: «Por força da divindade, as ações humanas de Cristo foram salutares para nós, produzindo em nós a graça, quer em razão do mérito, quer por uma certa eficácia». Entre estas ações os Evangelistas privilegiam aquelas que dizem respeito ao mistério pascal; mas não deixam de frisar bem a importância do contato físico com Jesus em ordem às curas de enfermidades (cf. Mc 1, 41) e a influência por ele exercida sobre João Batista, quando ambos estavam ainda no seio materno (cf. Lc 1, 41-44).

 

São José na Anunciação do Verbo. Desde o momento da Anunciação, José, juntamente com Maria, encontrou-se, em certo sentido, no íntimo do mistério escondido desde todos os séculos em Deus e que se tinha revestido de carne: O Verbo fez-se carne e habitou entre nós (Jo 1, 14). Sim, Ele habitou entre os homens e o âmbito da sua morada foi a Sagrada Família de Nazaré, uma das tantas famílias desta pequena cidade de Galileia, uma das tantas famílias da terra de Israel. Aí, Jesus crescia e «robustecia-se , cheio de sabedoria, e a graça de Deus estava com ele (Lc 2, 40).


Depositário do Mistério da salvação ao lado da Virgem Maria. Foi precisamente neste mistério que José de Nazaré participou como nenhuma outra pessoa humana, à exceção de Maria, a Mãe do Verbo Encarnado. Ele participou em tal mistério, simultaneamente, com Maria, envolvido na realidade do mesmo evento salvífico, e foi depositário do mesmo amor, em virtude do qual o eterno Pai «nos predestinou a sermos adotados como filhos, por intermédio de Jesus Cristo” (Ef 1, 5).


São José e a vida interior. Vemos que sua proteção e cuidado com o Menino-Deus refletem sua vida interior. Vida interior que o lança a servir, e esse exemplo se pode ser percebido na execução de suas ações frente aos sonhos. No segundo sonho, por exemplo, o anjo dá esta ordem a José: “Levanta-te, toma o menino e sua mãe, foge para o Egito e fica lá até que eu te avise, pois Herodes procurará o menino para o matar» (Mt 2,13). (cf. R. Custos)


São José, o silêncio e serviço. Quanto ao trabalho de carpinteiro na casa de Nazaré se estende o mesmo clima de silêncio, que acompanha tudo aquilo que se refere à figura de José. Trata-se, contudo, de um silêncio que desvenda de maneira especial o perfil interior desta figura. Os Evangelhos falam exclusivamente daquilo que José fez; no entanto, permitem-nos auscultar nas suas ações, envolvidas pelo silêncio, um clima de profunda contemplação. (cf. R.Custos)

 

Conformação com Cristo em Santa Teresa

 

O exemplo de santa Teresa, profundamente contemplativa e eficaz nas suas obras, leva-nos também a repensar e dedicar cada dia, o justo tempo à oração, a esta abertura a Deus, a este caminho para procurar Deus, para O ver, para encontrar a sua amizade e assim a vida verdadeira. Pois, “a oração mental nada é para mim senão um relacionamento íntimo de amizade, um freqüente entretimento a sós com Aquele que sabemos que nos ama” (V 8,5). Por isso, o tempo da oração não é perdido, é tempo em que se abre o caminho da vida, para aprender de Deus um amor ardente a Ele, à sua Igreja, e uma caridade concreta para com os nossos irmãos.


Oração e apostolado. Sobre a experiência mística na Igreja e a finalidade da “oração” para Santa Teresa, escreve Frei Cervera, dizendo que o valor da oração para o “apostolado” está no sentido “santificante da ação apostólica”, ao mesmo tempo que serão o “sentido final da vida cristã”. Portanto, Santa Teresa propõe uma mística da oração e de apostolado, esta afirmação está presente em todos os seus escritos, a começar pelo livro da Vida e pelo Caminho de Perfeição e, especialmente, no final do Castelo Interior, quando ela mesma vive imersa em Deus e vive dedicada ao serviço da Igreja. (7M 4,4 ss).

 

Santidade e Graças Místicas. A santidade é a conformação a Cristo no ser e no agir. Ele é o modelo supremo, e quanto Deus fez no seu “diletíssimo Filho” é a medida de quanto Deus fará com aqueles que ama. Nessas palavras temos a relativização das graças místicas: as graças são para a graça; a graça é a conformação com Cristo, a cuja imagem devemos nos conformar (cfr. Rm 8,29). É esta santidade cristã à qual são ordenadas todas as graças místicas. Em seguida explica: “Tenho por certo que o escopo destas graças seja fortificar a nossa fraqueza para que o possamos imitar no muito sofrer” (Ib.)

 

Esquecimento de si. O “esquecimento de si é com freqüência citado por Teresa neste contexto como um sentimento característico de quem aderiu a Deus com todo o coração. Os Santos, de fato, são os “esquecidos de si” (7M 4,11). Ela mesma o experimentou. No capítulo 3 das sétimas moradas onde a santa enumera alguns efeitos típicos da união transformante que tornam os místicos semelhantes a Cristo Crucificado recorda um dos efeitos produzidos pela comunhão com Cristo: “Um grande esquecimento de si, tão profundo que não se reconhece mais… Não quer ser nada em coisa alguma… Sente-se mergulhada em tão estranho esquecimento que parece não mais existir” (7M 3,2.15; cfr. Rel 6,1).

 

O bem de quem pratica a oração. A oração é a vida do coração novo e deve nos animar a cada momento. (CEC 2558) Sabemos que a oração é o carisma de Santa Teresa na Igreja, que não significa somente afirmar que é uma sua especialidade, mas sim afirmar que é este o dom de graça, o serviço eclesial, ontem e hoje. “O bem de quem pratica a oração – refiro-me à oração mental – obtém já foi tratado por muitos santos e homens bons. Glória a Deus por isso!… Por isso, peço aos que ainda não começaram que, por amor a Deus, não se privem de tanto bem… A oração mental nada é para mim senão um relacionamento íntimo de amizade, um freqüente entretimento a sós com Aquele que sabemos que nos ama”. (V 8,5) Assim, com a força dinâmica de sua oração, Santa Teresa instruíra suas filhas, e hoje a nós, cristãos e carmelitas deste tempo através de suas obras. Rezamos para servir melhor a Jesus Cristo. Eis a grande conformação com o Senhor.


Nos altos da doutrina teresiana

 

A cruz. O apelo constante a fixar o olhar em Cristo foi muitas vezes repetido por Teresa: “Os olhos no vosso Esposo” (CP 2,1); “Fixemos os olhos em Cristo” (1M 2,1); texto que recorda a exortação da Carta aos Hebreus sobre a “corrida que está diante de nós, mantendo o olhar fixo em Jesus, autor e aperfeiçoador da fé” (Hb 12,2). O olhar dirigido a Cristo adquire agora o tom de um desafio por parte de S. Teresa: “Fixai vossos olhares no Crucificado e tudo tornar-se-vos-á fácil. Se o Senhor nos demonstrou o seu amor com obras tão grandes e com tão horríveis tormentos, porque querê-Lo contentar somente com palavras?” (7M 4,8). O verdadeiro espiritual, o místico cristão encontra aqui o vértice da santidade. Ser espirituais consiste, portanto, em conformar-se com o Cristo crucificado, na identificação suprema da cruz e contemplando o selo da Cruz, que é marcado pelo fogo do Espírito, trazendo-nos o sinal de pertença e de comunhão com Cristo.

 

Ação e contemplação. A unidade entre ação e contemplação Santa Teresa os representa por Maria e Marta de Betânia no ápice do Castelo Interior, nas Sétima moradas. Antes de tudo propõe uma afirmação sobre a unidade entre oração e vida, tendo por certo que a vida espiritual consiste no crescimento harmônico da oração e das virtudes; o homem espiritual cresce e amadurece na oração que o une a Deus e nas obras com que ama os irmãos, encontrando assim uma harmoniosa unidade de vida. A oração precisa do espaço vital da existência para exteriorizar todas as suas possibilidades. Ao longo de todo o Castelo Interior a nossa autora indicou esta coerência de amadurecimento cristão: “Por isso repito, é necessário que procureis não fazer consistir o vosso fundamento somente no rezar e contemplar, porque se não procurais adquirir as virtudes e não vos exercitais nelas, permanecereis sempre anãs. E praza a Deus que vos limiteis somente a não crescer, porque nesta estradas, como bem sabeis, quem não cresce diminui” (7M 4,9).

 

O caminho da santidade. Enfatizamos que a estrada real da santidade pela qual se enveredaram os Santos seguindo as pegadas do Senhor, e traz na tipologia da unidade de vida as clássicas figuras de Marta e Maria, unidas já na harmonia da ação e da contemplação. “Eis, portanto, quanto gostaria que procurássemos. Desejemos e pratiquemos a oração não já para gozar, mas para ter a força para servir” (Ibi).

Celebrando ao lado da Solenidade de São José, com a vigorosa celebração dos 400 Anos de Santa Teresa, que fora impulsionadora de sua devoção, torna-se oportuno concluir, com o conselho de Santa Madre para encomendar a este glorioso santo as nossas causas e necessidades, unidas às intenções do santo padre o Papa Francisco, às necessidades da Igreja, do Carmelo e do mundo inteiro:


“Assim, tomei por advogado e senhor o glorioso São José, encomendando-me muito a ele. Vi com clareza que esse pai e senhor meu me salvou, fazendo mais do que eu podia pedir, tanto dessa necessidade como de outras maiores, referentes à honra e à perda da alma. Não me lembro até hoje de ter-lhe suplicado algo que ele não tenha feito. Espantam-me muito os muitos favores que Deus me concedeu através desse bem-aventurado Santo, e os perigos, tanto do corpo como da alma, de que me livrou. Se a outros santos o Senhor parece ter concedido a graça de socorrer numa dada necessidade, a esse Santo glorioso, a minha experiência mostra que Deus permite socorrer em todas, querendo dar a entender, que São José, por ter-Lhe sido submisso na terra, na qualidade de pai adotivo, tem no céu todos os seus pedidos atendidos.”
(Santa Teresa de Jesus – Vida 6,6)

 

GLORIOSO SÃO JOSÉ,
Rogai por nós!

 

Estela da Paz.
Estela Maria Teresa de Jesus, OCDS.
Comissão de Espiritualidade.
Comissão de História.

 

Referência:
Bíblia Sagrada – Evangelhos.
Catecismo da Igreja Católica.
Exortação apostólica Redemptoris Custos. S. João Paulo II, 15/08/1889.
Carta Apostólica Patris Corde. Papa Francisco, 08/12/2020.
Carta dos Superiores, O.Carm e OCD. 2020.
Livro da Vida, de Santa Teresa de Jesus.
Cervera, OCD. Frei Jesus Castellano. TERESA DE JESUS MESTRA DE VIDA ESPIRITUAL.

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